José Comblin, profeta da teologia

Onze anos da páscoa definitiva em 27/03/2011 – Morre em Simões Filho, BA, o padre José Comblin, teólogo latino-americano, profeta radical, comprometido com os pobres, escritor prolífico, Brasil.

Nascido em Bruxelas, Bélgica em 1923. Obra imensa com destaque para a pneumatologia ou Teologia do Espírito. Nascido em Bruxelas, Bélgica em 22 de março de 1923. Sacerdote e missionário belga, teólogo da Teologia da Libertação. Suas principais contribuições foram na teologia do desenvolvimento, na teologia da cidade, na teologia da prática revolucionária, na teologia dos direitos humanos e na teologia da libertação. Também merecem destaque suas análises sobre a ideologia da Segurança Nacional dos regimes militares latinoamericanos na década de 1970 e sobre o neoliberalismo. Era o filho mais velho de uma família com três irmãos e duas irmãs. Fez os primeiros estudos (ensino primário) estudos na escola paroquial e prosseguiu seus estudos (ensino secundário) no Colégio São Pedro.

Em 1940, entrou no Seminário Leão XIII, em Lovaina (Bélgica). Entre 1940 e 1942, fez estudos de ciências biológicas e filosofia. Em 1943, ingressou no Seminário São José em Malines (Bélgica), onde fez o 1º ano de teologia. Em 1944, ingressou no Seminário Maior de Malines, onde cursou o 2º e o 3º ano de teologia. Entre 1946 a 1950, cursou na Faculdade de Teologia em Lovaina, onde se tornou doutor em teologia. Em 9 de fevereiro de 1947, foi ordenado padre em Malines. Após a ordenação, exerceu a função de vigário cooperador na paróquia Sagrado Coração de Jesus, em Bruxelas, entre 1950 e 1958. Durante o ano de 1951, foi professor de teologia no CIBI (centro de formação para seminaristas em serviço militar). Em 1953, obteve doutorado em teologia pela Universidade Católica de Lovaina, orientado por Lucien Cerfeaux, com uma tese sobre o livro do Apocalipse.

Motivado pelo apelo Papa Pio XII, que no documento Fidei Donum (O Dom da Fé), pedia missionários voluntários para regiões com falta de sacerdotes, como os países da África e da América Latina, onde seria importante conter o avanço do comunismo, solicitou seu envio para a América Latina. Foi encaminhado para Campinas, SP, onde o bispo desejava sacerdotes doutores para contribuir na formação de seu clero. Chegou ao Brasil em 30 de junho de 1958. Entre 1958 e 1962, foi professor no seminário diocesano e na Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Além disso, foi convidado para ser assistente diocesano da Juventude Operária Católica (JOC).

Entre 1959 e 1962, também ensinou no Studium Theologicum dos Dominicanos em São Paulo, onde teve como alunos: Ivone Gebara, Frei Betto e Frei Tito.

Entre 1962 e 1965, foi professor na Faculdade de Teologia da Pontifícia Universidade Católica do Chile (Chile). Entre 1965 e 1968, convidado por Dom Hélder Câmara, foi professor no Seminário regional do Nordeste em Camaragibe e professor no Instituto de Teologia do Recife.

Entre 1968 e 1972 foi professor de teologia no IPLA (Quito, Equador) e assessor de cujo bispo, Dom Leônidas Proaño da Diocese de Riobamba. Até 1985 passava duas quinzenas por ano em Riobamba e continuou frequentando a diocese até a morte de Dom Leônidas Proaño, em 1988. Entre 1971 a 1988, foi professor de teologia pastoral na Faculdade de Teologia da Universidade Católica de Lovaina.

A partir de 1969 esteve à frente da criação de seminários rurais em Pernambuco e na Paraíba. A metodologia utilizada para os seminários era adaptada ao ambiente social dos seminaristas. Esta experiência lançou as bases para a Teologia da Enxada. Suas ideias o colocaram sob suspeita do regime militar. Foi detido, ao desembarcar no aeroporto de volta de uma viagem à Europa e deportado em 24 de março de 1972. Exilou-se no Chile durante oito anos, onde, em 1979, esteve à frente da criação de um Seminário Rural, em Alto de Las Cruces (Talca), que fomentava a formação ao sacerdócio de jovens do meio rural respeitando a sua cultura camponesa.

Em 1973, ocorreu o Golpe Militar no Chile, circunstância que forçou Comblin a se afastar do ensino para evitar chamar a atenção. Em seu livro A Ideologia da Segurança Nacional, publicado em 1977, destrinchou a doutrina que servia de base para os regimes militares na América Latina. Em 1980, foi expulso por Pinochet e conseguiu retornar ao Brasil, com visto de turista, circunstância que exigia renovação a cada três meses, o que o obrigou a sair do país a cada 3 meses durante seis anos, para renovar o visto, até que em 1986 foi anistiado e recebeu novamente o visto permanente.

Após retornar ao Brasil, reuniu-se com adeptos da Teologia da Enxada e recebeu o apoio do Arcebispo de João Pessoa, dom José Maria Pires, para, em 1981, fundar, em Avarzeado (Paraíba), um Seminário Rural, que, posteriormente, seria denominado como "Centro de Formação Missionária", que passou a funcionar em Serra Redonda, PB, que tinha como objetivo formar sacerdotes e missionários populares para a evangelização da população rural, com uma metodologia adequada e levando em consideração a cultura camponesa.

Nesse contexto, passou a dedicar-se prioritariamente à formação de lideranças populares. Em 1981, foi professor no Seminário Rural do Avarzeado (Pilões, PB), depois em Serra Redonda (PB), depois Centro de Formação Missionária. Sua atuação era inspirada no Padre Cícero e no Padre Ibiapina, dois grandes padres no cenário do nordeste brasileiro.

Em 1987, participou da fundação das Missionárias do Meio Popular, com o mesmo objetivo. Neste ano surgiu também o Programa da Árvore, que era uma formação de Animadores de CEBs na Arquidiocese da Paraíba que contava com a sua orientação.

Em 1989, fundou o Instituto de Formação Pastoral em Juazeiro (Bahia) em 1989, que posteriormente abriu núcleos em Mogeiro (Paraíba) em 1994, e em Miracema do Tocantins em 1987.

A partir de 1995 passou a residir na Casa de Retiros São José, em Bayeux (PB), onde continuou a dar assessoria a diversas entidades de formação de lideranças populares no Nordeste, além da assessoria teológica para os mais diversos grupos eclesiais ou sociais no Brasil e na América Latina. Também foi professor no curso de pós-graduação em missiologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Chamado de Padre José pelas pessoas com quem convivia, criou movimentos missionários leigos como os Missionários do Campo (1981).

No Equador foi assessor de Dom Leonidas Proaño, bispo de Riobamba, um dos principais articuladores da opção preferencial pelos pobres, assumida pela igreja católica latino-americana nas conferências de Medellín e PueblaComblin estava convencido de que a fé deveria ser refletida criticamente a partir da realidade dos pobres. Foi considerado um dos maiores expoentes da Teologia da Libertação vivendo no Brasil.

Os dois últimos anos de vida foram vividos na Diocese de Barra, na Bahia. Faleceu no dia 27 de março de 2011, no Recanto da Transfiguração, em Simões Filho, próximo a Salvador, para onde foi em tratamento de saúde, quando sofreu um ataque cardíaco.

Foi sepultado no Santuário de Santa Fé do Padre Ibiapina, em Solânea, pertencente à diocese de Guarabira, no estado da Paraíba.

Comblin foi um dos primeiros teóricos da "teologia do desenvolvimento", que parte da ideia que o desenvolvimento faz parte da vocação humana e é o motor da história. Em seus escritos, distingue duas concepções de desenvolvimento: "a técnica", que subordina o aspecto moral ao tecnológico, e a intelectual, que subordina o aspecto tecnológico a ao moral.

Posteriormente se dedicou ao estudo da "teologia da revolução" e da "prática revolucionária", coincidindo com o fervor utópico-revolucionário vivido na época, tanto no Terceiro Mundo quanto no Primeiro. Era uma época na qual a libertação se chamava revolução e a busca da liberdade gerava a práxis revolucionária. Comblin acreditava que o cristianismo, que não havia criado nenhuma revolução, podia recriá-las. O papel dos cristãos seria o de devolver a palavra e restituir a presença àqueles que nunca eram reconhecidos: os pobres, os sem nome, os marginalizados. O anúncio do Evangelho permitiria discernir nas revoluções do século XX as que contribuiriam para construir o Reino de Deus e as que colocavam obstáculos a essa construção.

Comblin participou das primeiras reuniões de um grupo de teólogos latino-americanos que seriam os fundadores da teologia da libertação, como: Gustavo Gutiérrez, o jesuíta Juan Luís SegundoLeonardo Boff e Segundo Galilea.

Acreditava que a Conferência de Medelín (1968) dera início a um modelo de Igreja libertadora na América Latina e madura buscando superar o colonialismo eurocêntrico de séculos. Publicou 65 livros e mais de 300 artigos, principalmente em português, espanhol e francês. Uma das obras mais belas é o livro O provisório e o definitivo, Ed. Herder. Mereceria nova edição.


Fernando Altemeyer Junior

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