É no presente que se joga a eternidade - Luiz Paulo Horta
Uma das consequências da visita do Papa Francisco ao Rio de Janeiro foi trazer à memória o simples fato de que o Brasil é o maior país católico do mundo. Parte do entusiasmo, do quase delírio que cercou essa visita vinha de uma cultura embebida em raízes cristãs. Isto se refere sobretudo à piedade popular, um dos temas preferidos de Francisco, traduzido em fenômenos como as devoções de Aparecida.
Partindo do fato de que a visita foi um sucesso, a pergunta é: de que maneira ela poderá afetar a realidade do catolicismo no Brasil, que, como se sabe, perde terreno para as correntes evangélicas?
A resposta depende de uma mudança profunda, que pode ou não acontecer. O catolicismo é tão antigo, no Brasil, que acabou confundindo-se com a própria estrutura da sociedade. A vida católica, para uma parte dos 80 ou 90% de brasileiros que se declaravam católicos, era uma coleção de ritos: batismo, crisma, primeira comunhão (com a regulamentar roupinha branca), casamento, bodas disso, bodas daquilo, e, finalmente, os ritos mortuários, sobretudo a missa de sétimo dia, em que a família dá à sociedade uma última satisfação.
Não há nada de errado com isso — ritos estão entranhados no cotidiano de todas as civilizações conhecidas e cumprem funções insubstituíveis. O problema é você ficar só nisso, e achar que já está bom.
Por essa brecha entraram as correntes evangélicas, que, por serem mais novas, são mais informais e mais calorosas. Elas oferecem aos seus seguidores diferentes formas de vida comunitária, promovendo muitos encontros, organizando atividades (e, claro, pedindo uma colaboração financeira).
É esse quadro que o Papa Francisco deseja mudar — e, em tese, ele tem condições para isso. Nesses dias de Brasil, ele se revelou um comunicador incomparável, capaz de dizer coisas profundas na linguagem mais simples. E o que ele propõe é quase uma volta às origens da Igreja. A volta a uma comunidade autêntica, reunida em torno de uma vida sacramental que significa reviver o mistério do Cristo.
Isso implica o contato direto e constante entre as pessoas. Daí se chega até o papamóvel sem vidros. Como ele disse aos jornalistas, em seu voo de retorno a Roma: “Por ter menos segurança, eu pude estar com as pessoas, abraçá-las, saudá-las, sem carros blindados. Sempre existe o perigo de que um louco faça alguma coisa, mas a verdadeira loucura é criar um espaço blindado entre o bispo e o povo. Prefiro o risco a essa loucura”.
Todo o Bergoglio está nessa colocação. Ele é o pastor que vai em busca da ovelha perdida onde ela estiver. É o pai que acolhe o filho pródigo com uma festa. É o Papa que diz: “A Igreja deve ser a facilitadora da fé, e não o contrário”. É o Papa que diz: “Quem sou eu para julgar os gays?”
E nessa coleção de posturas ele é, acima de tudo, o homem do Encontro. Encontro como troca de vida. Encontro que não divide as pessoas em amigos e inimigos, como gostam de fazer alguns regimes políticos. Neste sentido, ele é o homem do futuro. Mas não gosta que digam isso. Porque ele sabe que no presente é que se joga a eternidade
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A resposta depende de uma mudança profunda, que pode ou não acontecer. O catolicismo é tão antigo, no Brasil, que acabou confundindo-se com a própria estrutura da sociedade. A vida católica, para uma parte dos 80 ou 90% de brasileiros que se declaravam católicos, era uma coleção de ritos: batismo, crisma, primeira comunhão (com a regulamentar roupinha branca), casamento, bodas disso, bodas daquilo, e, finalmente, os ritos mortuários, sobretudo a missa de sétimo dia, em que a família dá à sociedade uma última satisfação.
Não há nada de errado com isso — ritos estão entranhados no cotidiano de todas as civilizações conhecidas e cumprem funções insubstituíveis. O problema é você ficar só nisso, e achar que já está bom.
Por essa brecha entraram as correntes evangélicas, que, por serem mais novas, são mais informais e mais calorosas. Elas oferecem aos seus seguidores diferentes formas de vida comunitária, promovendo muitos encontros, organizando atividades (e, claro, pedindo uma colaboração financeira).
É esse quadro que o Papa Francisco deseja mudar — e, em tese, ele tem condições para isso. Nesses dias de Brasil, ele se revelou um comunicador incomparável, capaz de dizer coisas profundas na linguagem mais simples. E o que ele propõe é quase uma volta às origens da Igreja. A volta a uma comunidade autêntica, reunida em torno de uma vida sacramental que significa reviver o mistério do Cristo.
Isso implica o contato direto e constante entre as pessoas. Daí se chega até o papamóvel sem vidros. Como ele disse aos jornalistas, em seu voo de retorno a Roma: “Por ter menos segurança, eu pude estar com as pessoas, abraçá-las, saudá-las, sem carros blindados. Sempre existe o perigo de que um louco faça alguma coisa, mas a verdadeira loucura é criar um espaço blindado entre o bispo e o povo. Prefiro o risco a essa loucura”.
Todo o Bergoglio está nessa colocação. Ele é o pastor que vai em busca da ovelha perdida onde ela estiver. É o pai que acolhe o filho pródigo com uma festa. É o Papa que diz: “A Igreja deve ser a facilitadora da fé, e não o contrário”. É o Papa que diz: “Quem sou eu para julgar os gays?”
E nessa coleção de posturas ele é, acima de tudo, o homem do Encontro. Encontro como troca de vida. Encontro que não divide as pessoas em amigos e inimigos, como gostam de fazer alguns regimes políticos. Neste sentido, ele é o homem do futuro. Mas não gosta que digam isso. Porque ele sabe que no presente é que se joga a eternidade
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