NEW ou OLD HIT? - Daiane Oliveira

Considerações sobre o possível caso de estupro de duas menores, na Bahia.

Você percebe que vive numa sociedade doente, quando baseado no preconceito mais deslavado, a vítima é julgada pela sociedade, ao invés do réu. Soma-se, então, à violência do acontecimento, da situação, a violência do “julgamento social” invertido da situação, do acontecimento. 

Mais um caso desta inversão perversa aconteceu, agora envolvendo duas menores, que teriam sido estupradas por integrantes de uma banda de pagode, aqui na Bahia. O fato ganhou os noticiários, e as redes sociais, e muitos são os que atribuem ao comportamento das menores a culpa pelo acontecido. Ingênuos marmanjos rebolativos teriam sido envolvidos pelo canto da sereia das meninas, e embalados pelo milenar feitiço, foram levados a executar o ato torpe. Coitados, são dignos de pena, da pior pena possível, se forem confirmadas as acusações de estupro. 

Não é minimamente razoável pensar que um homem pode vir a ser obrigado a praticar uma coisa dessas, imagina vários, como foi o caso envolvendo a banda de pagode, New Hit. Aliás, poderíamos até pensar em mudar o nome da banda para Old Hit, porque há milênios nós mulheres somos tratadas como as culpadas pelas violências que sofremos, eternas Evas pecadoras, como já escrevi noutro texto, sobre a mesma temática. Quando vamos parar com isso, ou ao menos parar para pensar sobre isso? 

Chega de permitirmos que a violência continue como pedra fundamental da sociedade! Mulher alguma pede para ser estuprada, por este ou aquele comportamento, assim como homem algum pede para ser estuprado por sair sem camisa, exibindo bíceps e tríceps, a tanto custo talhados nas academias da vida. A chamada Marcha das Vadias traz esses questionamentos, para tentar fazer a sociedade enxergar o óbvio. Usamos pesos e medidas diferentes, para julgar mulheres e homens, e o peso para se julgar a mulher a esmaga, nos esmaga. 

Somos constitucionalmente responsáveis pela equidade entre os gêneros, mas não a fazemos. Somos constitucionalmente responsáveis por educar e proteger crianças e adolescentes, e estamos falhando em ambos os casos. Não estamos educando, e não estamos protegendo. Permitimos, por exemplo, que as piores letras de pagode, e de outros ritmos, sejam disseminadas ditando regras e comportamentos, e depois fazemos uso desses comportamentos para justificar o injustificável. 

De tudo isso só me resta a condenação dessa sociedade preconceituosa, hipócrita, míope, injusta, petrificada nos seus atavismos, algoz, cúmplice e conivente de tantas e tamanhas violências. Se a banda praticou ou não o crime de estupro contra as menores, logo saberemos, mas quando saberemos conviver em harmonia, com respeito, com dignidade, sem a armadilha do preconceito a mascarar e proteger atos que envergonham o gênero humano? A resposta para esta pergunta ainda habita no vácuo. Enquanto isso, resgatemos as meninas do banco dos réus, pois, se confirmada a suspeita, ele precisa e deve ser ocupado pelos seus verdadeiros donos. Pelo menos isso.

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