Como o Ensino Religioso pode se tornar referencial estruturado de aprendizagem e interpretação da realidade?

Antes de tudo, é preciso reconhecer qual a natureza do que chamamos Ensino Religioso (ER). Ainda há, entre muitos, uma concepção quase unicamente ligada à preocupação por "formação em valores". Que existe, claro está. Mas não é sobre esse aspecto que se concentram os sonhos do ER como referencial estruturado de aprendizagem e interpretação da realidade. Para nossa instituição, trata-se de um componente curricular (assim como matemática, história, geografia, física, química, etc.) que, regulamentado pelo MEC, tem caráter científico. Isso significa que seu objeto de estudo é o “fenômeno religioso”, sendo vedadas todas as propostas que objetivem “catequizar” ou “ensinar doutrinas” específicas dessa ou daquela religião. A formação em valores é, dessa maneira, uma demanda de todos os componentes curriculares, não só do ER.

Esclarecido o parâmetro (superação da antiga concepção, marco legal e objeto de estudo), podemos, sim, afirmar que o ER tem excelentes possibilidades de interferir sistemicamente na aprendizagem, interpretação da realidade e, finalmente, despertar da consciência individual e coletiva de estudantes. E aqui talvez resida uma utopia pois, à maneira das ciências humanas, tem vasto campo para o estímulo ao engajamento comunitário, seja ele social, político ou mesmo religioso. Isto, claro, se entendemos a experiência de “engajamento” como resultado de uma decisão pessoal refletida e discernida pela consciência. 

Um exemplo: O professor de ER, ao falar sobre símbolos religiosos no Ensino Médio, descreveu, com tom de vidente, a “decoração” dos lares das famílias soteropolitanas típicas: ferraduras atrás de portas, pirâmides nas mesas de centro da sala, pequenos budas nas estantes, imagens de santos populares e, claro, a bíblia aberta na sala, geralmente no salmo 23 ou no salmo 91. A cara de surpresa pela “adivinhação” do professor impactou e despertou nos estudantes a atenção ao característico sincretismo cultural-religioso do povo brasileiro e, especialmente, do baiano. Isto, me parece, é aprender e apreender algo que “me situa existencialmente” e, portanto, “me conscientiza”. Em outras palavras, aquilo que os estudantes percebem na realidade lhes é reapresentado com atribuição de sentidos e, portanto, gera-se conhecimento.

Tal aprendizagem será tanto mais efetiva quanto mais claras, para o professor, forem as referências apontadas pela matriz curricular do ER: Eixos Estruturantes (Fundamentos, Linguagem Religiosa, Relações Religiosas), Conteúdos Nucleares, Competências, Objetivos de Aprendizagem (para cada segmento, verticalmente) de maneira a colocar em evidência, em cada aula, o fenômeno religioso e a religiosidade.

Na raça e na paz Dele,
J. Braga.

P.s.: Postagem realizada em curso EaD sobre Matriz Curricular do ER.

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