Sobre política e mentiras

O mensalão e a política dos chimpanzés - Luciano Pires

Mentira como instrumento
para se "dar bem"
Em seu livro “Chimpanzee Politics”, o primatologista alemão Frans de Waal apresentou os resultados de sete anos de estudos com uma colônia de chimpanzés no zoológico e Arnhem, na Holanda. O trabalho de De Waal, somado ao de outros primatologistas reconhecidos, como Nicholas Humphrey, contribuiu grandemente para a compreensão do comportamento dos primatas em sociedade. Suas descobertas foram imediatamente relacionadas ao comportamento dos seres humanos, especialmente por ele introduzir na primatologia o pensamento do italiano Nicolau Maquiavel – explicitado em seu famoso livro O Príncipe -, cunhando o termo “Inteligência Maquiavélica”, que mais tarde chamamos de “maquiavelismo”. A inteligência maquiavélica diz respeito a técnicas aplicadas por quem quer ter sucesso político na sociedade e compreende comportamentos como fazer e quebrar alianças, falar verdades ou mentiras, fazer e quebrar promessas e regras, manipulação, etc. O maquiavelismo está presente em todas as instâncias de nossas vidas, seja nos grandes grupos sociais ou no seio de nossas famílias, e a mentira é seu maior instrumento. Demonstrando que os macacos também usam a mentira como instrumento para resolver conflitos e serem bem sucedidos em suas sociedades, De Wall concluiu que homens e macacos são simplesmente tipos diferentes de... macacos!

Uma das conclusões dos estudos sobre a mentira e suas aplicações, como por exemplo a trapaça, indicam que o mentiroso sempre considera o que o outro estará pensando. Quem mente para você, portanto, está de certa forma avaliando o seu grau de inteligência. Se o mentiroso considera que você é um estúpido, incapaz de perceber relações de causa e consequência ou as implicações morais das escolhas, mentirá desavergonhadamente, como faz uma criança de quatro anos de idade que diz os maiores absurdos para evitar uma punição. E alguns mentirosos profissionais consideram que você é um macaco...

Bem, onde quero chegar? Começa o julgamento do Mensalão pelo Supremo Tribunal Federal. Durante as próximas semanas estaremos expostos, como nunca antes na história deste país, a uma das maiores coleções de mentiras já pronunciadas no idioma português. Algumas são tão absurdas, tão vigaristas, tão indecentes, que me sinto ofendido só de ouvi-las. Não perderei tempo aqui elencando mentiras, já está tudo mais do que explicitado na internet, rádio, jornais, revistas e televisão. Quero apenas fazer uma sugestão: siga o julgamento sob o ponto de vista da inteligência maquiavélica. Observe a forma como os advogados dos acusados farão ginásticas verbais para dar às mentiras um verniz de verdades ou fazer com que crimes deliberados pareçam deslizes de incompetentes. Observe como grupos organizados, especialmente na imprensa, manipularão as versões dos acontecimentos. Repare nos olhares, nos sorrisos, nos gestos.

Estaremos nos próximos dias como esteve De Waal no zoológico de Arnhem: observando um grupo de macacos que mentem.

Mas não se engane.

Para eles, o macaco é você.

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