Valores intangíveis x Valores monetizáveis

Mas só isso? - Luciano Pires
Qual valor você dá às coisas que não consegue medir? 

Uma vez fui palestrar numa grande fábrica em uma cidadezinha no interior do Rio Grande do Sul. Conversei com um diretor da empresa que me disse que o auditório da fábrica era o melhor – talvez único – da cidade e que eles se orgulhavam disso, mas que quando decidiram construí-lo foi uma dureza convencer outros diretores de que era algo necessário. O “valor”, que para aquele diretor era o significado do auditório como um ponto de distribuição de conhecimento, integração e celebração, para os outros diretores era inexistente. Auditórios em fábricas não dão lucro, só despesas. E por isso não devem ser construídos...

Em minha palestra A FÓRMULA DA INOVAÇÃO, discuto essa questão da percepção de valor. Percepção é coisa íntima, cada um tem a sua, não dá para emprestar, vender, comprar ou medir. E “valor” é relativo. Quer ver?
Entre os textos que circulam na Internet existem pérolas, como esta que recebi anos atrás:

“Um homem de idade já bem avançada veio à Clínica onde trabalho para fazer um curativo na mão ferida. Estava apressado, dizendo-se atrasado para um compromisso e enquanto o tratava perguntei-lhe sobre qual o motivo da pressa. Ele me disse que precisava ir a um asilo de anciãos para, como sempre, tomar o café da manhã com sua mulher que estava internada lá. Disse-me que ela já estava há algum tempo nesse lugar porque tinha o mal de Alzheimer num estágio bastante avançado.
Enquanto acabava de fazer o curativo, perguntei-lhe se ela não se alarmaria pelo fato de ele estar chegando mais tarde.
- Não, ele disse. Ela já não sabe quem eu sou. Faz quase cinco anos que não me reconhece. Estranhando, perguntei:
- Mas se ela já não sabe quem o senhor é, porque essa necessidade de estar com ela todas as manhãs?
Ele sorriu e dando-me uma palmadinha na mão, disse :
- É . Ela não sabe quem eu sou, mas eu sei muito bem quem ela é.”

O valor que para o médico era o reconhecimento do esforço, para o marido era a satisfação de retribuir um amor.

Mais uma história: no início dos anos de 1920, George Mallory, o então mais famoso alpinista inglês, preparava-se para escalar o monte Everest. Um jornalista curioso perguntou-lhe “por quê?”. E Mallory deu a resposta definitiva:

- Porque ele está lá. 

O valor que para o jornalista era a fama e a fortuna obtidas com a conquista do Everest, para Mallory era a simplesmente a satisfação de chegar lá.

As histórias do auditório na fábrica, do velhinho no consultório e de George Mallory no Everest, mostram como é difícil entender e aceitar atitudes que aparentemente não buscam resultados tangíveis, mensuráveis. A vida toda somos treinados para trocar coisas: dou meu esforço e em troca recebo algo que posso contar, pendurar na parede, pesar, guardar no cofre ou no banco. Quando esse algo é “apenas” a realização de um sonho, a retribuição de um amor ou outro benefício intangível, ficamos espantados, quase que sem saber como reagir e perguntando: mas só isso?

Essas “coisas” não tem valor...

Pois é. Acreditar que é possível expressar a complexidade de nossas vidas apenas em valores tangíveis explica muito do que se vê de feio por aí.

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