Colégio Cearense - Anos 90

Poderia até render verdadeiras homenagens à memória desse cara, quantas lembranças! Quanta exatidão! mas prefiro mesmo exaltar a força das palavras, a pulsação do texto. Nesse peito realmente bate um coração marista! Parabéns Georgge.
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1996 - por Georgge Plutarco

Avançamos. Não somos mais novatos. Agora estudamos à tarde, subimos até um andar e não estamos mais na sala daqueles pivetes. Somos grandes como aqueles meninos da 3ª série, mas não tão enormes como os da 5ª. Com quantos anos estamos? Catorze? Quinze? Na verdade, nove. Mesmo já conhecendo o Colégio Cearense todo, temos que nos acostumar a essa grande mudança: aquele terreno, no qual passaram tanto tempo trabalhando em obras, finalmente foi finalizado e deu lugar ao Prédio Novíssimo. O quarteirão foi tomado inteiro pelo Colégio. Ou melhor, quase inteiro. Ainda restou a casa em que mora uma senhora muito misteriosa, onde a bola cai as vezes. A biblioteca não é mais atrás da quadra e o auditório ficou ainda mais antigo. Agora contamos com o Teatro Marista. A representação da Via Sacra seria lá a partir de agora, e é pra lá que nós vamos, para o Irmão Kerginaldo dar as boas-vindas a todos. Com a cabeça completamente branca, aquele homem simples sobe ao palco e pronuncia lentamente aquelas palavras já conhecidas de todos, para abrir qualquer discurso: "Prezados alunos, professores e funcionários da Comunidade Marista". E ele encerrava sempre com uma oração, fechando com “Ámem”, e não Amém.

Olha! Temos duas professoras agora. Como elas são sérias. A Professora Edilma, com esses óculos, deve ser um carrasco. E a Professora Fabíola Forte, com esse nome então, não deve ser moleza. Algumas semanas precisaram passar para vermos que são duas mãezonas. Cada uma, um amor de pessoa. Mal sabíamos que raros seriam os professores que, futuramente, decorariam o nome de todo mundo e se importariam com a dificuldade de cada estudante daquela lista de chamada que estava chegando agora. Por que todos os garotos estão tentando escapar de ser o número 24? Sim, somos grandes, mas muita coisa eu ainda não entendo. 

Pode até parecer difícil de entender também o que a Professora Nancy falava, que ensinava inglês. É. Isso assustou muita gente. No entanto, eu tava doido pra começar logo. Queria essa coisa diferente, que poucos ou ninguém sabia que, até esse tipo de coisa, deixava saudade. Mas não mais saudade que a Professora Nancy deixou. É. Saudade do pior tipo. Aquela que não dá pra remediar. Alguns anos depois, ela iria se juntar ao Irmão Urbano. Que esteja em paz.

Os livros encapados com o nosso nome carregam ainda o cheiro de novo. Dureza mesmo é ver o conteúdo aumentar e ter que aprender a multiplicar fazendo essas expressões numéricas. Só prestar atenção na aula não é mais suficiente. Tinha que levar a matéria pra casa e estudar para a A.C. (Avaliação Contínua) e, depois, para a A.S. (Avaliação Sistemática). Esses medos começam a surgir, só que eles não dão tanto pavor quanto a nova coordenadora. A Rita entra na sala com a professora e até a zoada se esconde em algum lugar. Acho que dentro daquele armário que têm as colas coloridas, tesouras e cartolinas. A coordenadora usa umas pulseiras que chegam perto do cotovelo. Os brincos de argola de vez em quando batem no ombro. A turma diz, em segredo, que são bambolês. Deixa ela ficar sabendo disso. Seria capaz de ir falar com “aquela que você sabe quem”. Sim. A Supervisora Vanda. Melhor se comportar do que sequer correr o risco de ouvir as reclamações dos nossos gritos eufóricos na hora de ir embora.

Apesar de ser o terceiro ano consecutivo ali, ainda vemos surpresas a cada dia. Hora de fazer fila pra ir até a Biblioteca Monteiro Lobato. Se deslocar ao novo espaço era divertido. E por que não, emocionante? Nós pulamos do primeiro lance de escadas até o térreo, como uma atração de parque. Ruim é parar por causa do tempo. Agora é hora de ter aula de leitura com a Professora Hermínia. Vamos ler um livro “paradi sei lá o quê” chamado A Ilha Perdida. Quando a professora baixava a vista para iniciar a leitura, começam as brincadeirinhas do tipo “desconta lá e não tem volta”. Pelo menos é mais saudável que brincar de “Castanha”, que mudou o nome várias vezes, porque os professores já tinham desconfiado. A biblioteca fica abaixo da sala de dança. Dança? Nós? É o jeito. E o jeito era voltar um pouco mais cedo pra sala, porque ia ter a votação do Grêmio para novas chapas. Lembro de uma cujo slogan dizia “Se você enxerga mal, vá numa ótica. Se você enxerga bem, vote na Ética.”

E o clima de eleições ficava dentro da sala mesmo quando as chapas iam embora. Era a nossa hora. Temos que eleger o líder religioso, esportivo e o sociocultural. Quero me candidatar a algum deles. Não pode ser o sociocultural, pois não sei nem o que é isso. Religioso? Tá certo, eu tou longe de ser um santo. Resta o esportivo, porque jogar bola é que é bom. Eu acho que agora eu posso fazer meu próprio racha. Cansei de não ganhar nada no Racha do Manel. Posso fazer meu jogo. Acho que pra isso serve o líder esportivo, não apenas para descer na hora de cantar o Hino Nacional. Eu deveria ter mais espaço na sala do Grêmio. Se é que isso é possível naquele cubículo. Atrás do balcão que tinha a foto até dos nossos ancestrais de baixo do vidro, muitos pediam bola de tudo, pra não ter que jogar espiribol com o estojo. E eu, nunca conseguia. Opa! Voltando, achei uma garrafinha de Pitchula. Vamos jogar no longo corredor ao lado da capela.

Meus amigos têm coragem pra colocar mais medos nos menores. Posso confiar neles na hora de conseguir um espacinho no colégio pra jogar ou brincar de alguma coisa nova. Somos grandes, porém, mesmo assim, vez por outra comemos Cheetos pra ver se vinha um novo Tazo pra coleção. Para muitos, isso deixou de lado o Bafo.

O tempo passa e vemos que o espaço do colégio não é o limite. No segundo semestre, nós fazemos um trabalho de campo. Uma pesquisa valendo nota, toda a turma. É o Dunas Brancas, que não sei se é mais lazer ou avaliação. Por mais que a gente se diverta, na semana seguinte será o período que passaremos todas as anotações bizarramente feitas dentro do ônibus em movimento para o computador. Agora nós somos encaminhados para um Laboratório de Informática, não mais uma salinha para usar o programa da tartaruguinha. Agora o programa é o Everest, que serve para organizar uma sucessão de slides e executar a apresentação do Dunas Brancas.

O Brasil perdeu a chance do título inédito nas Olimpíadas de Atlanta para a Nigéria. Para mim, resta tentar um resultado melhor nos Jogos Olímpicos Champagnat, quando chega a Simar - Semana de Integração Marista, que, cada ano que passava, mostra uma rivalidade maior entra as turmas. As pernas tremem só de entrar no ginásio lotado. O martelado dos pés que corriam no piso de taco reverbera em qualquer lugar, quando fecho os olhos. Pais, professores e infinitos alunos estão nas arquibancadas para torcer. Todo time tem o seu grito. Ou melhor: os mesmo gritos: “Passou, passou, passou um avião, na asa tinha escrito Turma C é campeão!” O ídolo maior dos campos profissionais não é mais o Romário, é um menino de cabeça raspada que se achava o melhor do mundo. E Ronaldinho era.

A gente se desdobrava em milhares para dar conta também da Feira de Ciências. Ainda bem que tinha ajuda dos novos Laboratórios de Ciências. A gente precisa decorar um monte de coisa pra garantir uma boa última nota nas A.S. Decorar, não. Aprender. Já diria qualquer professor. Apesar da correria, é bom ter uma semana de descanso das aulas.

Depois desse período, folheando a agenda, percebo que o ano já está no fim. É sagrado dar um beijo de despedida em cada professora. E eu me divirto a cada página da agenda, em que têm escrituras de vários pensadores. Quem tinha o trabalho árduo de coletar pensamentos para todos os dias do ano? Não sei. E aqui vai meu agradecimento a essa pessoa que não conheço, mas que me faz refletir. Nas últimas folhas, vejo que nem todos os adesivos foram pregados. Só aqueles que eram usados pra fingir chamar o amigo e grudá-lo em suas costas. O ano inteiro que eu tinha pela frente em janeiro, agora estava no fim. O mais importante é que eu tenho a consciência da grande mensagem que um dos pequenos adesivos transmite e que, por causa disso, iria usá-lo em um canto realmente importante. Ele diz “Aqui bate um coração Marista.” E sempre baterá.
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Na raça e na paz Dele,
J. Braga.

Comentários

  1. Adorei meu amigo, passou um filme na minha cabeça, tudo isso foi maravilhoso e quantas saudades, não dá mais pra voltar atras e é uma pena! Parabéns Braga. Paulo Roberto Oliveira Cordeiro Ex aluno Marista Cearense de Coração

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