Antes que tudo se estrague - Alfredo Roberto Marins Junior

Se pararmos para ouvir as conversas dos nossos avós, ou pais (dependendo da idade deles) poderíamos chegar à conclusão de que estamos vivendo uma era de ápice tecnológico e declínio da qualidade de vida.

Temos a praticidade de obtenção de comida (supermercados, restaurantes, lanchonetes); mas ela é de qualidade inferior, possui gorduras trans, colesterol ruim, hormônios de crescimento dados aos animais para antecipar o abate. Sem contar as pragas do fast food e das frituras saborosas que entopem nossas artérias. 

Tenho duas hipóteses para isto: a primeira diz que nossas memórias são apócrifas, imprecisas. Não nos lembramos das coisas como elas realmente foram; mas de como queremos lembrá-las. Assim, nós as polimos, dando-lhes um brilho que elas não possuíam. A segunda e menos otimista, é que as coisas realmente se degradam.

Temos meios de transporte mais rápidos e confortáveis, carros com direção hidráulica e computador de bordo, ar condicionado, ônibus de luxo. Aumentamos a freqüência de vôos e reduzimos as caminhadas, mesmo que para buscar o pão francês e o leite na padaria, o que nos deixou mais sedentários e preguiçosos.
Temos celulares, iPhones, e outros aparatos de comunicação, e os utilizamos para tirar autorretratos de braço estendido, armazenar músicas pirateadas e redigir mensagens truncadas, cheias de abreviaturas e ícones. Possuímos poderosos equipamentos de comunicação e nos comunicamos mal. Enterramos os fones nos ouvidos, isolamo-nos do convívio e somos atropelados enquanto escrevemos mensagens de texto.

Se observarmos nossas próprias experiências (também dependendo da sua idade), concluiremos que eles parecem ter razão: nossas brincadeiras e brinquedos pareciam mais divertidos que os videogames atuais; nossas escolas pareciam melhores, menos violentas, com professores mais dedicados, turmas mais entrosadas. Nossos amigos eram mais amigos, nossos objetivos mais nobres e aspirações mais dignas. 

Tudo parece piorar!

Tenho duas hipóteses para isto: a primeira diz que nossas memórias são apócrifas, imprecisas. Não nos lembramos das coisas como elas realmente foram; mas de como queremos lembrá-las. Assim, nós as polimos, dando-lhes um brilho que elas não possuíam.

A segunda e menos otimista, é que as coisas realmente se degradam.

Se deixarmos de lado o saudosismo dos tempos passados e observarmos fria e fisicamente o comportamento dos elementos ao longo do tempo, concluiremos que há uma verdade no fundo de todas estas histórias. E que esta verdade tem até um nome científico: entropia.

De uma forma muito simplificada, (muito mesmo) entropia é a condição inerente a todos os elementos e processos naturais ou artificiais de se degradarem. 

O conceito pode parecer difícil, mas a idéia é simples: você enche seu computador de programas, baixa arquivos da internet constantemente, não utiliza nenhum antivírus, desliga a energia antes do momento correto e não entende o porquê dele ficar cada vez mais lento. Até que um dia, ele deixa de funcionar.

Diante desta explicação, você poderá estar pensando “Mas isto poderia ser evitado”. Evitado não, adiado. Algum dia seu computador deixaria de funcionar. Inevitavelmente. A diferença entre isto acontecer no próximo mês ou durante a próxima Copa do Mundo, é a manutenção que você faz em seu computador.

Sim manutenção, ações que possibilitam o aumento da vida útil: limpeza das partes físicas, testes de rotina no sistema operacional, atualização para resolução de problemas, proteção contra vírus.

Mas não é só o computador que requer manutenção. As casas se desgastam, os carros, os eletrodomésticos. Nós nos desgastamos, nossos relacionamentos idem. 

Sabendo disto, empresas contratam profissionais especializados na manutenção preventiva e corretiva de máquinas e do ambiente de trabalho. E se eles conhecessem da mitologia hindu, escolheriam Vishnu como símbolo de sua tarefa.

Vishnu era o conservador. Aquele que tornava próspera a vida humana entre o despertar construtor de Brahma e o adormecer destruidor de Shiva. Em tempos cíclicos, ele assumia a forma de algum animal ou ser humano, para ensinar as virtudes aos homens, para protegê-los de monstros e conduzi-los pelo bom caminho.

Ele compreendia a importância da manutenção, pois quando deixava de fazê-la, a humanidade alcançava rapidamente altos níveis de deterioração e era preciso permitir que Shiva destruísse tudo, para que um novo mundo melhor recomeçasse.

Como não temos essa opção, é fundamental estarmos atentos à manutenção.

Antes que tudo se estrague...
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Na raça e na paz Dele,
J. Braga.

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